quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Incenso.


INCENSO

Quando dentro de um templo, a corola de prata
do turíbulo oscila e todo ambiente incensa,
fica pairando no ar, intangível e densa,
uma escada espiral que aos poucos se desata.

Enquanto bamboleia essa escada e suspensa
paira, uma ânsia de céus o meu ser arrebata,
e por ela a subir numa fuga insensata,
vai minha alma ganhando a rumo azul da crença.

O turíbulo é uma ave a esvoaçar, quando em quando
arde o incenso... Um rumor ondula, no ar se espalma,
sinto no meu olfato asas brancas roçando.

E, sempre que de um templo o largo umbral transponho,
logo o incenso me enleva e transporta minha alma
à presença de Deus na atmosfera do sonho.

Gilka Machado 

Leia mais um soneto e a biografia da autora aqui:
 
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segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Conclusão.

 

CONCLUSÃO

Deve ser bom morrermos, já que a vida,
De uma grande quimera não passou.
E, que subiu, desceu e na descida,
No cadáver do sonho tropeçou.

Deve ser bom morrermos, se caída,
Na dúvida a existência se enlaçou.
Se surgiu esperança, após surgida,
Em rumo de descrença se afastou.

Na voragem do tempo não sentimos,
Que os tão ligeiros dias que vencemos,
Em demanda do fim seguindo estão.

E na mesma voragem resumimos,
Que somente na morte encontramos,
De todo o amargo a doce conclusão.

R.S. Furtado 
 
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sábado, 22 de fevereiro de 2014

Rondó.

 
RONDÓ

Vem, meu belo navegante!
Vem ancorar no meu porto.
Faz renascer exultante
Um coração que está morto.

Faz-me outra vez radiante
Este olhar hoje absorto
À espera de um barco errante
De onde me vem o conforto.

Dos oceanos que viste
Traz-me a cantiga que existe
No arrojo de cada onda.

Traz as canções que ouviste
E faz o meu riso triste
O sorriso de Gioconda. 

Zilma Ferreira Pinto
 
 
Zilma Ferreira Pinto nasceu em Tacima-PB. Muito jovem, ingressou por concurso no magistério, missão que exerceu não só na sua cidade natal como em Alagoa Grande, Pocinhos, Cabedelo e João Pessoa, cidade onde atualmente reside. Ainda criança compôs seus primeiros versos. Iniciou-se nas letras paraibanas com o Cancioneiro Experencial, em 1987. Sua obra tem sido reconhecida, tendo obtido alguns prêmios entre os quais... Leia mais aqui: 

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quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Soneto à Rendeira.

 
SONETO À RENDEIRA

O linho é uma oração remota, nesse
fluir fabril de fio para a flor.
Move-se o coração da moça, e esquece
o tempo prisioneiro, em derredor

da sombra esguia que à almofada tece.
Move-se , em seu afã modelador
de paz, o mito imemorial da prece
que do limbo da morte inventa o amor.

Movem-se dentro dela o sol e o vento.
Move-se o mar, e os pórticos se movem
das águas em perpétuo movimento...

Move-se a gênese em seu corpo jovem.
E, enquanto o olhar medita, os dedos tecem
gestos de amor que os lábios não conhecem.

Francisco Carvalho



Francisco Carvalho é filho de Clicério Leite de Carvalho e Maria Helena de Carvalho. Nasceu em Russas, Ceará próximo a Santa Cruz do Borges. Fez os estudos primários para mais tarde ingressar no Ateneu São Bernardo, em Russas onde publicou seus primeiros versos numa pequena tipografia. Permaneceu em Russas até 1939, ano em que seu pai veio a falecer após longos seis meses de agonia, fato este que marcaria por toda a vida a memória do poeta. Foi então para a cidade de Fortaleza, capital do Estado do Ceará, levando a família. Ali fixou-se ingressando como profissional de carreira da Universidade Federal do Ceará. Fez parte da vida intelectual de Fortaleza participando de movimentos literários e mantendo relações de amizade com os principais escritores de seu tempo. Em 1996 sua obra Raízes da Voz seria escolhida para leitura do vestibular daquele ano. Em 2004 o cantor e compositor cearense Raimundo Fagner lançou o álbum "Donos do Brasil" com as seguintes composições de Carvalho: "O Bicho Homem", "Esse Touro Vale Ouro", "Cesta Básica", "Reino/Minueto da Porta". Em 2009 foi concedido o Prêmio Francisco Carvalho de Poesia, com uma pequena publicação, na ocasião do evento anual XI Encontro Cultural Russano. Em 2012, aos 85 anos, o poeta teve parte de sua obra poética traduzida para o búlgaro.



Francisco morreu em 4 de março de 2013, por volta das 23h30. A causa da morte do escritor foi falência múltipla dos órgãos.



Fonte: Wikipédia.

 
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terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Inês de Manto.


 
INÊS DE MANTO

Teceram-lhe o manto
para ser de morta
assim como o pranto
se tece na roca

Assim como o trono
e como o espaldar
foi igual ao modo
de a chorar

Só a morte trouxe
todo o veludo
no corte da roupa
no cinto justo

Também com o choro
lhe deram um estrado
um firmal de ouro
o corpo exumado

O vestido dado
como a choravam
era de brocado
não era escarlata

Também de pranto
a vestiram toda
era como um manto
mais fino que roupa

Fiama Hasse Pais Brandão
 
Dramaturga, tradutora e poetisa, nasceu a 15 de agosto de 1938. em Lisboa, e faleceu a 19 de janeiro de 2007, na mesma cidade. Frequentou o colégio St. Julian's School, em Carcavelos, e, mais tarde, o curso de Filologia Germânica da Universidade de Lisboa. Fez crítica de teatro, estagiou no Teatro Experimental do Porto (1964), e foi, com Gastão Cruz- com quem se casaria- e outros, fundadora do grupo teatro Hoje (1974. Ao longo da sua vida, exerceu atividade de... Leia mais aqui:

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domingo, 16 de fevereiro de 2014

O Migrante.

O MIGRANTE

Emigrante e imigrante de mim mesmo,
sem passaporte sigo nos mares e ares.
Não me atrapalha o mundo e seus lindes,
e cruzo qualquer pátria clandestino.
 
Limites impressos em códigos e mapas
não são fronteiras, não, para um poeta.
Inferno é o mundo máximo. O resto,
pegadas vãs – pó e pó, barro no barro.
 
Vou e volto dentro do eu-planeta,
ao sopro do poema – vento no velame
do barco da carne. O corpo voa!
 
Não me detém o mundo: suas alfândegas,
feitas de mofo, o vento as leva
- enquanto chego e parto a qualquer hora. 


Fernando Mendes Vianna 
 

Nasceu  no  Rio  de  Janeiro em 1933. Poeta e tradutor de poesia. Estreou em 1958 com  Marinheiro  no  Tempo  Construção no  Caos (Rio de Janeiro, ed. Simões). Seguiram-se A Chave e a Pedra (Rio de Janeiro: São José, 1960), Proclamação do Barro (Rio  de  Janeiro: José Álvaro, 1964). O Silfo-Hipogrifo (Rio de Janeiro: José Olympio/MEC)obteve o Prêmio Literário do INL de 1972 na categoria de inéditos; Embarcado em Seco(Rio de Janeiro:Civilização Brasileira/MEC,1978); Marinheiro no  Tempo: antologia ( Brasília: Thesaurus, 1986 ) – Prêmio  Literário Nacional do INL na categoria obra publicada); Ah, Último Paraíso (Zaragoza, 1998); Antologia Pessoal (Brasília:Thesaurus, 2001); A Rosa Anfractuosa(Brasília: Thesaurus, 2004). Traduziu Quevedo e os clássicos espanhóis... Leia mais aqui: 

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quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Rosinha.



ROSINHA

Lindinha era a Rosinha, ainda menina,
Um mimo, levadinha e muito sapeca.
Vivia brincando sempre com boneca,
Pois era essa a sua principal rotina.

Cresceu ficou moça, elegante, bonita
E com a boneca logo deixou de brincar.
No cabelo sempre um belo laço de fita,
Quando saía de casa para a rua passear.

Olhava para os lados sempre sorrindo,
Dizia, um bom moço eu vou encontrar.
Quem sabe aquele que ali vem vindo,
Me fará uma proposta para namorar.

Ela não era cigana, mas estava certa,
Ao passar o rapaz, com paixão a olhou.
Sem pensar, de namoro lhe fez a oferta,
E Rosinha feliz, de imediato aceitou.

Com ele namorou, noivou e logo casou,
Algum tempo depois, já não estavam sós.
Pois num certo dia uma prendinha chegou,
E os pais da mulher Rosinha já eram avós.

R.S. Furtado.

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terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Banzé de Cuia.

 


BANZÉ DE CUIA

Negro tá com morrinha
tá com o diabo no couro
e não provoca, não, cabra safado
porque do contrário vai haver banzé de cuia,
forrobodó.

Em casa a negra velha tá fula de raiva,
já andou dando sopapos no marido,
espremendo os moleques
e xingando a vizinha,
que não lhe quer emprestar
um pires de farinha.

Não mexe com o negro, não, negrada.
Ele está acuado e não quer prosa, não.

Negro entra no boliche,
pede fiado um “mata-bicho”
e senta na calçada, cuspindo:

Porcaria de vida...

Lobivar Matos
 
Lobivar Barros de Matos, (Corumbá, 11 de janeiro de 1915 – Rio de Janeiro, 27 de outubro de 1947), marcou sua vida artística pela simplificação da assinatura Lobivar Matos, autor de Areôtorare: poemas boróros (1935) e de Sarobá (1936). Alguns escritos sobre a vida do autor revelam que sua infância, pela região pantaneira, fora digna de uma infância comum. No entanto, o mesmo não pode ser dito de sua juventude, repleta de atitudes fortes e marcantes principalmente pelo que pode ser visto em sua composição poética.
Partido das considerações publicadas num artigo escrito por José Octávio Guizzo, a pesquisadora Susylene Araújo afirma em... Leia mais aqui:

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domingo, 9 de fevereiro de 2014

No Banquete.

 
NO BANQUETE

Do alto dos seus bordados, o general falou:
Meio século, senhores, a serviço da Pátria.
Falaram depois o doutor e o magnata.
Outros mais falaram no banquete da vida nacional.
Só o roceiro miúdo não falou nada.
Porque não sabia nada,
Porque estava ausente,
perrengado,
indiferente,
curvado sobre o cabo da enxada,
com o Brasil às costas.

Leo Lynce

  
Cyllenêo Marques de Araújo Valle nasceu na cidade de Pouso Alto, hoje Piracanjuba, no dia 29 de junho de 1884, filho de João Antônio de Araújo Valle e de Eponina Marques de Araújo Vale e faleceu em Goiânia, no dia 7 de julho de 1954. Iniciou seus estudos em Bela Vista de Goiás e aos 16 anos de idade, abraçou a carreira jornalística com a publicação de O funil, manuscrito e desenhado, com pretensões literárias. Escrevia nesta época para os jornais mineiros Araguari e Lavoura e Comércio, de Uberaba.

No ano de 1905, em Bela Vista, foi fundado o jornal Folha do Sul, pelos combativos irmãos Benedito Monteiro Guimarães e Honestino Guimarães, sendo um dos principais colaboradores e ali nasceu e passou a assinar o anagrama Leo Lynce. Leia mais aqui:

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sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Sé de Pedra.

 
SÉ DE PEDRA

Não reparaste nunca? Pela aldeia,
Nos fios telegráficos da estrada,
Cantam as aves, desde que o sol nada,
E, à noite, se faz sol a luz cheia...

No entanto, pelo arame que as tonteia,
Quanta tortura vai, n'uma ânsia alada!
O ministro que joga uma cartada,
Alma que, às vezes, d'além-mar anseia:

– Revolução – Inútil. – Cem feridos,
Setenta mortos. – Beijo-te! – Perdidos!
– Enfim, feliz! – ! – Desesperado. – Vem!

E as lindas aves, bem se importam elas!
Continuam cantando, tagarelas:
Assim, António, deves ser também.

António Nobre
 
Poeta português, nascido em 1867, no Porto, e falecido a 18 de março de 1900, na mesma cidade. A infância e a adolescência de António Nobre foram passadas entre Leça da Palmeira, onde o pai, antigo emigrado no Brasil, possuía uma quinta, e a Foz do Douro. Tendo estudado em colégios do Porto, frequentou os principais centros da boemia portuense, convivendo com figuras literárias como Raul Brandão e Júlio Brandão e publicando criação poética. Frequentou posteriormente a Faculdade de Direito de Coimbra, onde, com Alberto de Oliveira, fundou a revista Boémia Nova, cuja polêmica com a publicação de... Leia mais aqui:

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