quarta-feira, 6 de maio de 2009

O passeio

O PASSEIO
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Ele esticou o braço direito, o qual lhe pareceu pesado demais. Girou-o em espaços invisíveis, encontrando só o vazio absoluto. A sua mão, por instantes, continuou tateando no escuro, mas percebeu haver tocado em algo macio e frio. Realmente o que desejava: um travesseiro. Rapidamente o colocou no lugar mais apropriado: a sua dolorida cabeça... Havia, dentro de si, uma premente necessidade: se libertar dos seus atrozes pensamentos... Eles, imbativelmente, o perseguem dias e noites. Uma marcação constante, sem cessar. As suas lembranças, inexoravelmente, movem-se dentro de si – escravizando-o permanentemente. Mas, são apenas os retalhos de recordações, às vezes, sem nexos, que não estabelecem os vínculos da realidade que precisa conhecer. Entre lençóis brancos e macios sobre a cama, tenta lentamente se virar. Mas, não consegue. Sua imaginação vagueia, tirando-o Dalí, levando-o a acontecimentos idos, muito distantes. Precisa encontrar, não no passado longínquo, mas de tempo recentíssimo, a nítida lembrança do que lhe aconteceu – antes de ser levado para ali. É urgente saber, a fim de esclarecer a razão de todo o seu tormento mental. A sua irritante preocupação transluz-se por todo o seu semblante. Nele, vê-se uma incontestável lástima. Em seu atribulado esforço mental – extenua-se. A sua cabeça dói, palpita incessantemente. O seu corpo queima em febre, parecendo possuir crepitantes chamas interiores.
De novo, lentamente, tenta mexer-se na cama, mas, não consegue. Quer dormir, sossegar... impossível. Em natural e ínfima disposição, ajeita-se um pouco. Pretende apagar da mente os seus confusos pensamentos. Quanto mais se empenha em retirá-los, ardilosamente eles se avivam em sua atormentada consciência. Há, em si, latente, uma pergunta agressiva, inquietadora... “- Por que estou aqui?” os seus pensamentos caminham rápidos, em torvelinhos, complicando-se, sem nada esclarecer. As horas, entretanto, parecem paradas, intermináveis. Em seu quarto de hospital, a escuridão prolonga-se indefinidamente. São momentos de angustiantes vazios, por demais tristes enfadonhos. Às vezes, surgem devaneios em embalos trágicos, enlouquecedores. É a manifestação de sua consciência preocupada. Mesmo desejando o sono, o estado de repouso não acontece. “- Por que essas imagens sem a completa nitidez?” Intimamente, assusta-se, pois, as mesmas parecem esconder algo terrível... Felizmente, chega a sua tela mental uma bela manhã de sol. Praia e mar... Ele e a sua família harmoniosamente reunida. O filho, Roberto, cautelosamente se aproxima: “- Pai! Mãe! Vamos tomar banho de mar?” A resposta veio imediata: “- Agora não”. O garoto levantou a cabeça louro-bronzeada, mostrando em sua fisionomia uma astuta expressão do seu forte olhar. Dentro de si caudalosas energias, querendo expressar toda a raiva da sua majestosa impaciência.
Posicionou-se, firmando bem os pés, e chutou um montículo de areia. Com o forte impacto, essa pequena elevação de decompôs em finíssimas partículas, movendo-se pelo vento em várias direções. Mas, o menino, logo em seguida voltou para perto dos seus pais. Um incontrolável impulso o fez falar, novamente: “- Mamãe, quem é esse cara que está bebendo com papai?”... “- É João, amigo do seu pai”. Em poucos instantes, Leandro, o pai, fala em tom imperativo: “- Gilda, leve o Roberto para o banho de mar... vê se ele não me enche”.
Naquele dominical encontro de amigos, copos cheios com bebidas alcoólicas, seguidamente, se encheram e se esvaziaram várias vezes. A conversa entre os dois tinham frutos suculentos de maledicências, mexendo com a reputação das pessoas que progrediram honestamente. A manhã e à tarde se passaram rapidamente, trazendo os aspectos do início da noite. A esposa Gilda e o filho Roberto se aproximam pra fazer mais um apelo: “- Leandro! É noite... vamos para a nossa casa?”. Na cidade, as luzes clareiam os caminhos dos homens, os quais, de há muito substituíram o seu andar pelo passo rápido das máquinas. Mais uma solicitação para, finalmente, Leandro concordar em atender. Bêbado, em cambaleios alcoólicos, segura a chave e se dirige ao carro.
Leandro, embriagado, dirigindo o seu carro julga que segue em completa segurança. Seus pensamentos estão em ritmos lentos, mas, a velocidade do seu carro aumenta cada vez mais... De repente, acontece o impacto. Violento. Terrível... Ouvem-se fortíssimos ruídos, sons metálicos e de vidros entrechocando-se com agressivas impetuosidades. Gritos lancinantes são ouvidos na noite. Angústias se afirmando em sentimentos de dores e desesperos. Frações de segundos rapidamente transformados em sofrida eternidade. Desmaios... O sangue fluindo, querendo esvaziar os corpos feridos. Vive-se o silêncio que parece paralisar tudo... Dias depois, Leandro retorna a sua consciência exterior. Logo, sente o ar enjoativo de quarto de hospital. Nesse ar fétido, misturados a curativos e remédios, tenta se mexer, desejando se levantar de corpo inteiro. Não consegue. Com muito esforço, lentamente, consegue suspender só o braço direito. Alcança o interruptor e... A luz se faz. Leandro, em profundo desespero, solta um grito de terror.
“- Onde estão as minhas pernas?... - O que fizeram com o meu braço esquerdo? –Eu quero a minha esposa e o meu filho, agora!!!” Como resposta só o constrangedor silêncio, feito com os fios da angústia e da completa desolação. Chorou compulsivamente, sem se aperceber do giro do tempo, a ausência de alguns dias e noites.
Pelos corredores do hospital, uma voz em alto brado gritava com a entonação do completo desespero e da nítida expressão de loucura. “- Por que estou aqui?... Eu, também, morri com a minha esposa e com o meu filho... Prendam o assassino, pelo amor de Deus!...”


Otacílio Negreiros Pimenta
In Memorian

11 comentários:

Global Future disse...

Very unique blog.
Great presentation and fantastic pictures. Wow...

I like your blog.

I would like to invite you join a global green community. Please visit:
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Please share this information to your family and friends, so we can save our planet for next
generation. Thanks and enjoy a better world.

Keep blogging.
Good day.

Lú Naíma. disse...

"Gritos lancinantes são ouvidos na noite. Angústias se afirmando em sentimentos de dores e desesperos. Frações de segundos rapidamente transformados em sofrida eternidade. Desmaios... "


Pura realidade, do início ao fim, tão real que causa arrepios.
Infelizmente, não há um dia em acidentes como este não aconteçam.
Infelizmente.


Beijos

Anônimo disse...

Texto emocionante, tanto mais que a ficção, neste caso, é pura realidade, infelizmente.
Bj.

Unknown disse...

....Enquanto ela a consciência dorme, eis o estado de transe, questionamentos e confusões, até mesmo do quem sou...
Que pena... quando ainda pessoas esperam um grito mudo para acordar suas consciências que adormecem em virtude do prazer...
Enfim, ela acorda, num tempo; imersa em culpas, e parcialmente ainda assim, busca um outro culpado para a culpa de si mesmo...
Maravilhoso e realista o texto.

Abraços

Livinha

Ps:Furtado, aproveito o ensejo para convida-lo a dar uma passadinha em meu blogger. Recebi indicação em variedades 2009 e aceitei. Passe lá e vote. Basta clicar no selo.
Desde já agradeço o seu carinho.
Obrigada
Lívia

A.Tapadinhas disse...

As suas palavras, para além da sua correcção, são um tremendo libelo acusatório contra a inconsciência que grassa, infelizmente (e impunemente, direi eu) nas estradas.

É uma chamada de atenção para todos os homens e mulheres que se preocupam com o seu semelhante.

Tem de se começar por algum sítio... Já!

Abraço.
António

Unknown disse...

Furtado,

O furacão de vez em quando aparece,
passa voando deixa sua marca, esquece,
e vai cantar em outra freguesia,
somente a Brisa, é mais precisa,
quando presente no dia-a-dia...
Adoro teus comentários... muito bom!
Fez muito bem participar!!!
Ainda não consegui votar, mas votarei...

Abraços e obrigado.

Anônimo disse...

Já votei, Rosemildo.
Boa sorte!
Bj e bom fds.

PS: Já agora, passe pelo meu blog e gostaria muito que trouxesse o selinho que ofereço a todos os meus seguidores.

Beatriz disse...

por que estamos aqui?

Dora Casado disse...

É mais real do que gostaríamos...
Obrigada pela visita e desculpe a demora em aparecer. Tive uns probleminhas...
Bom fim-de-semana.

Mara faturi disse...

Adorei sua visita, volte sempre que quiser;) serás sempre bem-vindo; Belo e triste texto...estou adorando passear por aqui,
um abraço!

Anônimo disse...

Che post emozionante, fa impressione,sono passato per un saluto!!

Ciao e a presto!!

Visita questo blog ti piacerà... grazie...

http://snavigando.wordpress.com